terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

ELEIÇÕES 2012

SAUDAÇÒES!

Vamos começar observar os futuros candidatos!

DEMOCRACIA, ELEIÇÕES E RESPONSABILIDADE POLÍTICA*

Sgt João Evangelista

Introdução

Nosso objetivo é examinar a validade empírica de duas proposições: (1) que a democracia é um regime político que se distingue pela responsabilidade dos governantes perante os governadosI e (2) que é por meio de eleições que esta responsabilidade é garantida. Estas proposições são obviamente relacionadas: a primeira é conseqüência da segunda dada a definição de democracia como o regime no qual os governantes são selecionados mediante eleições. Em conseqüência, a estrutura do argumento que pretendemos examinar é a seguinte: (1) a democracia é um sistema que garante a responsabilidade política (hipótese empírica) porque (2) a democracia é um regime no qual os governantes são escolhidos por meio de eleições (definição) e (3) a responsabilidade política é garantida por meio de eleições (hipótese empírica). Se tudo isto parece excessivamente detalhista, aguarde um momento.

Procederemos da seguinte forma: na primeira seção explicitaremos nossos critérios para classificar os regimes políticos, distinguindo diferentes tipos de democracias e ditaduras, e forneceremos algumas informações que situam a ocorrência destes regimes; na segunda seção analisaremos estatisticamente o impacto das condições econômicas sobre a sobrevivência dos governantes; na terceira seção estudaremos como os governantes são escolhidos em diferentes tipos de democracia e, na quarta seção, consideraremos o papel das eleições como mecanismo de produção de responsabilidade política. Uma conclusão breve, basicamente uma lista de dúvidas, fechará o texto.

Regimes políticos

Classificamos como democracias1 os regimes que durante um determinado ano satisfazem quatro critérios simultaneamente: (1) o chefe do executivo é eleito (direta ou indiretamente); (2) o legislativo é eleito; (3) mais de um partido compete em eleições2 e (4) partidos no poderII já perderam eleições no passado e cederam o comando do governo, ou o farão no futuro.3 Regimes que não satisfazem a pelo menos um destes quatro critérios são classificados como ditaduras.

As democracias não são todas iguais, e a diferença mais relevante para os nossos objetivos é a que existe entre regimes parlamentaristas e presidencialistas. Democracias parlamentaristas são aquelas nas quais o legislativo pode mudar o executivo; democracias presidencialistas são aquelas nas quais o executivo não pode ser deposto pelo legislativo durante o mandato.4 Há ainda sistemas mistos, onde o presidente é eleito mas o executivo depende da confiança do legislativo para sobreviver.5 Com exceção do regime português de 1976-81, no entanto, todos os demais sistemas mistos são muito mais próximos do parlamentarismo do que do presidencialismo, e nós os agrupamos com as democracias parlamentaristas na maior parte das análises que se seguem.

Existem também várias diferenças entre as ditaduras, dentre as quais novamente escolhemos apenas uma. Distinguimos entre ditaduras institucionalizadas, que denominamos "burocracias", e as de regimes personalísticos, as quais denominamos "autocracias". Ao fazermos esta distinção nos apoiamos, por um lado, na intuição de Maquiavel (tal como destacada por Bobbio, 1989) de que decisões coletivas requerem regras de funcionamento para o corpo decisório e, por outro, na distinção feita por Montesquieu entre governo baseado em leis e governo baseado na vontade ou, como em alguns casos, capricho dos governantes. Tomamos a existência de um corpo legislativo eleito como uma indicação de que o regime tem regras mínimas de operação interna e de que os governantes anunciam suas decisões à população em forma de leis, ainda que eles próprios não se sujeitem a estas leis. Portanto, classificamos como burocracias as ditaduras nas quais um corpo legislativo existiu durante um dado ano e como autocracias aquelas sem legislativo.6

Nossa amostra é composta por 135 países (o que inclui todos os casos de democracia) observados entre 1950 (ou o ano de independência ou o primeiro ano para o qual dados econômicos estejam disponíveis) — o "ano de entrada" — e 19907 — o "ano de saída" —, resultando em um número total de 4.126 anos. Excluímos ainda a Suíça, o Uruguai antes de 1966 e a Iugoslávia depois de 1980, dado que tinham um executivo coletivo, resultando em um total de 4.060 anos. Nesse período observamos 99 democracias (as quais duraram um total de 1.606 anos) e 123 ditaduras (com um total de 2.454 anos). Entre as democracias, contamos 51 sistemas parlamentaristas (1.039 anos), 9 sistemas mistos (147 anos) e 42 regimes presidencialistas (420 anos).8 Existem, portanto, 102 regimes democráticos diferenciados em termos de suas instituições.9 Dentre as ditaduras, observamos 132 burocracias (1.785 anos) e 98 autocracias (669 anos), somando um total de 230 regimes ditatoriais.10

Democracia e responsabilidade política

Governos são responsáveis na medida em que os cidadãos podem discernir se os governantes estão agindo de acordo com os seus interesses e sancioná-los apropriadamente, de forma que os governantes que satisfazem os cidadãos permanecem em seus postos e aqueles que não os satisfazem perdem suas posições. A responsabilidade política é um mecanismo retrospectivo, no sentido de que as ações dos governantes são julgadas a posteriori, em termos dos efeitos que causam.

Os governantes são responsáveis no sentido aqui empregado se a probabilidade de sua sobrevivência no governo depender do desempenho do governo; caso contrário eles não o são. Especificamente, responsabilidade pode ser caracterizada pela derivada da "taxa de risco" com relação aos resultados gerados durante um certo número de anos passados, onde a taxa de risco é a probabilidade condicional de que, tendo ocupado o governo por uma duração t = 0, 1, 2,..., os governantes saiam de seus postos em (t + dt), dt®0. Governantes são responsáveis, então, se sua taxa de risco cresce e a probabilidade de sobreviver no governo diminui à medida que o desempenho econômico piora.

Como "governantes" tomamos os chefes do executivo: presidentes em regimes presidencialistas, primeiros-ministros em regimes parlamentaristas ou mistos, e quaisquer que sejam os governantes efetivos nas ditaduras. Estes algumas vezes são explicitamente designados como ditadores, mas em outras carregam títulos tais como "chefes de juntas militares", presidentes, líderes do partido governante, executores do estado de emergência ou reis.11

Em 3.386 dos 4.060 anos que observamos não houve nenhuma troca de governantes. Houve uma troca em 568 anos, duas em 91, três em 13, e quatro e cinco em 1 ano cada. Assim, no conjunto ocorreram 798 mudanças de governantes, com uma média de uma a cada cinco anos. Observamos um total de 792 períodos de governo, isto é, anos de mando contínuo pela mesma pessoa.12 Destes, 198 ou foram interrompidos porque a pessoa morreu, ou continuaram após 1990.13 Neste sentido, estes períodos são "censurados". Uma vez eliminados os períodos censurados, restaram 594 períodos de governo que terminaram entre 1950 e 1990 por razões não acidentais.

Alguns governantes alteraram a natureza do regime político durante o período no qual se mantiveram no poder. Isto aconteceu durante 55 períodos de governo: em 45 deles o regime mudou uma vez sem que houvesse troca de governante; em 7 períodos o regime mudou duas vezes; em 2 três vezes, e em 1 período o regime mudou seis vezes. A maioria destas mudanças ocorreu entre diferentes tipos de ditaduras, causadas pela abertura ou fechamento do legislativo.14 Algumas poucas, no entanto, foram de democracia para ditadura (como no caso do Uruguai sob Juan Bordaberry em 1973), ou vice-versa (como no caso da Nicarágua sob Daniel Ortega Saavedra em 1984). Por esta razão estes regimes devem ser mantidos separados no cálculo da duração média de governantes em cada tipo de regime político. Estas durações médias são apresentadas na Tabela 1.

Tabela 1
Número de Períodos e Duração Média de Governo segundo o Regime Político
(Excluindo os Períodos Censurados)

Regime Número de Períodos Duração Média
PARLAMENTARISTA 216 3,86
MISTO 51 2,35
PRESIDENCIALISTA 86 4,34
BUROCRACIA 122 7,64
AUTOCRACIA 88 3,03
MUDANÇA DE REGIME* 31 10,81
TOTAL 594 4,81

* Como alguns períodos censurados também sofreram alteração do regime político, este número não corresponde ao número total de períodos de governo nos quais houve mudança de regime (55). Ver definição de períodos censurados no corpo do texto.

Os indicadores de desempenho econômico que consideramos incluem o leque de variáveis normalmente utilizadas em estudos sobre o "voto econômico", isto é, indicadores de renda, emprego e inflação. Especificamente, consideramos as seguintes variáveis:15

CRPC - taxa de Crescimento da Renda Per Capita;

CFT - taxa de Crescimento da Força de Trabalho, um proxi para o nível de emprego;

CCPC - taxa de Crescimento do Consumo Per Capita;

GOV - proporção do gasto do GOVerno no Produto Nacional Bruto;

IPC - taxa de alteração do Índice de Preços ao Consumidor.

Estimamos, então, a probabilidade de sobrevivência de um determinado governante no poder dada a duração de seu governo e estes resultados econômicos.

A Tabela 2 demonstra (em seus dois primeiros painéis) que a sobrevivência dos chefes de governo em regimes democráticos não depende de condições econômicas.16 A única variável econômica que parece se relacionar com a sobrevivência de governantes em democracias parlamentaristas (incluindo as mistas) é o crescimento da força de trabalho. Quanto maior a taxa de crescimento do emprego, maior é a probabilidade de sobrevivência de primeiros-ministros. O crescimento da renda per capita ou do consumo per capita, a taxa de inflação ou a proporção dos gastos públicos não afetam as chances de sobrevivência de primeiros-ministros. Por outro lado, nenhum dos indicadores de desempenho econômico se relaciona com as chances de sobrevivência de presidentes em democracias, mesmo se controlarmos por períodos ou para a América Latina.

Tabela 2
Sobrevivência de Governantes por Tipo de Regime (distribuição Weibull)

PARLAMENTARISMO (censurando períodos em curso em 1990)
Variável* Coeficiente Erro Padrão t Prob|t|³x Média (X) Erro Padrão(X)
CRPC 0.75610E-02 0.1226E-01 0.617 0.53737 2.6880 4.4367
CFT 0.74972E-01 0.4759E-01 1.575 0.11521 1.2764 1.0861
CCPC 0.62292E-02 0.1096E-01 0.569 0.56969 2.5126 6.9336
GOV 0.34887E-02 0.9281E-02 0.376 0.70700 16.181 6.1317
IPC -0.16532E-02 0.1852E-02 -0.893 0.37197 12.173 37.155

PRESIDENCIALISMO (censurando períodos em curso em 1990)
Variável Coeficiente Erro Padrão t Prob|t|³x Média (X) Erro Padrão(X)
CRPC 0.53945E-02 0.9563E-02 0.564 0.57269 0.49800 6.0428
CFT -0.35251E-02 0.5209E-01 -0.068 0.94604 2.3555 0.98149
CCPC 0.21748E-03 0.9085E-02 0.024 0.98090 0.99991 4.7490
GOV 0.89785E-02 0.7109E-02 1.263 0.20660 16.055 5.7869
IPC 0.47829E-04 0.8290E-04 0.577 0.56397 237.41 965.93

PRESIDENCIALISMO (censurando períodos em curso em 1990 e períodos com limitações constitucionais ao número de mandatos presidenciais)

Variável Coeficiente Erro Padrão t Prob|t|³x Média (X) Erro Padrão(X)
CRPC 0.21122E-01 0.2197E-01 0.961 0.33644 0.49800 6.0428
CFT 0.13803 0.7924E-01 1.742 0.08152 2.3555 0.98149
CCPC 0.23803E-01 0.1924E-01 1.237 0.21608 0.99991 4.7490
GOV -0.10548E-02 0.1425E-01 -0.074 0.94099 16.055 5.7869
IPC***não converge***

*As variáveis de desempenho econômico foram introduzidas uma de cada vez.

É desnecessário dizer que estes resultados são tanto surpreendentes como desalentadores. Se a democracia é um sistema no qual os governantes são escolhidos por eleições, e se as eleições são um mecanismo pelo qual os eleitores premiam os governos que vão bem e punem aqueles que vão mal, a sobrevivência de governantes em regimes democráticos deveria ser sensível ao desempenho econômico. Os dados sugerem que a sobrevivência de primeiros-ministros é ligeiramente sensível ao crescimento do emprego, mas isto é tudo o que encontramos, sendo que mesmo este resultado é bastante tênue. A sobrevivência de presidentes, por sua vez, parece ser completamente independente do desempenho econômico.

Estes resultados tornam-se particularmente enigmáticos se considerarmos o fato de que vários estudos baseados em pesquisa de opinião ou em séries temporais de dados agregados para países individuais demonstram que os eleitores tendem a votar a favor dos governantes quando as condições econômicas são boas e contra eles quando estas condições são ruins (Lewis-Beck, 1988, p. 155, e 1991, pp. 1-2).17 Estes efeitos, no entanto, tendem a ser pequenos e instáveis: Paldam (1991, p. 181) estima que "indicadores econômicos explicam perto de um terço da variação na popularidade dos partidos", enquanto Kiewiet e Rivers (1984, pp. 374-375) acrescentam uma nota de cautela com relação à experiência norte-americana. Além do mais, não somos os únicos a descobrir que as variáveis econômicas não afetam o voto dos governantes em análises comparativas baseadas em dados agregados. Strom e Lipset (1984; 163 eleições entre 1950 e 1982) concluíram que a inflação era importante para o período pós-1973, mas não o desemprego e a produção industrial. Lewis-Back e Mitchell (1990; 27 eleições em cinco países) descobriram um efeito moderado da inflação e do desemprego mas não do crescimento da renda. Host e Paldam (1990) e Paldam (1991; 197 eleições em 17 países) observaram principalmente que os coeficientes para a inflação com freqüência têm um sinal trocado. Powell e Whitten (1993; 102 eleições entre 1969 e 1988, 19 países) descobriram que a inflação, o desemprego e o crescimento não produzem efeitos sistemáticos. Remmer (1994; 21 eleições presidenciais em 12 países latino-americanos) observou que algumas variáveis econômicas têm um efeito sobre os resultados políticos, mas os coeficientes são pequenos. Pacek e Radcliffe (1995; 52 eleições em oito países em desenvolvimento) concluíram que os governantes são punidos quando a economia está declinando, mas não são premiados quando esta está em expansão. Portanto, parece que em diferentes amostras, diferentes variáveis econômicas afetam os resultados políticos; mas as evidências neste sentido estão longe de ser robustas.

Uma possível razão para esta instabilidade dos resultados pode se dever ao fato de que condições institucionais específicas devam estar presentes para que a responsabilidade política se manifeste. Com o fim de examinar esta possibilidade, procuramos reproduzir, pelo menos em espírito, a análise desenvolvida por Powell e Whitten (1993). Para eles existem fatores institucionais que afetam a habilidade dos eleitores em discernir e punir os governantes. Em conseqüência, uma vez que estes fatores sejam mantidos constantes, a relação entre desempenho econômico e sobrevivência de governantes deve-se tornar mais forte. Powell e Whitten estão particularmente preocupados com a "clareza de responsabilidades", isto é, se o quadro institucional permite que os eleitores sejam capazes de discernir a quem punir.

Reproduzimos a análise apresentada na Tabela 2 controlando pela proporção de cadeiras legislativas detidas pelo maior partido na câmara baixa; por uma variável dicotômica indicando se existe um partido majoritário no legislativo; pelo número efetivo de partidos legislativos; por uma variável indicando se o governo é de coalizão ou não; e outra indicando se os militares estão envolvidos na política ou não.18 Todas estas variáveis afetam a sobrevivência de governantes, mas o que importa para os nossos propósitos é que nenhuma delas modifica a relação entre sobrevivência de governantes e desempenho econômico. Portanto, a "clareza de responsabilidade" não afeta em nada a responsabilidade política em relação a resultados econômicos.

Estes resultados são também perturbadores. Claramente, a afirmação de que a democracia induz à responsabilidade é, no mínimo, ampla demais. É possível que existam condições institucionais, as quais não conseguimos identificar, sob as quais ela o faça. Porém, estas condições não são imediatamente aparentes, sendo possível que sejam na verdade bastante raras.

Democracia e eleições

Surpreendidos e desapontados, tudo o que nos resta fazer é questionar o óbvio: que o elo teórico entre democracia e responsabilidade política se produz via eleições.19 Se os governantes são eleitos e se, ao enfrentar eleições, eles antecipam as reações dos eleitores aos resultados que suas políticas irão gerar, eles são, então, politicamente responsáveis. Mas são os governantes eleitos em regimes democráticos? Em um certo sentido esta questão precisa, sim, ser desconstruída.

A Tabela 3 apresenta um resumo dos modos de seleção dos governantes nos três regimes que realizam eleições.20 É verdade que democracias são regimes no quais a probabilidade de que os governantes deixem o governo devido a eleições é maior: 47% dos primeiros-ministros e 64% dos presidentes deixaram seus postos quando os eleitores selecionaram outra pessoa, enquanto 21% dos governantes em burocracias o fizeram.21 Entretanto, muitos primeiros-ministros deixaram o governo sem que os eleitores fossem consultados, ao passo que muitos presidentes saíram apesar de que os eleitores possam ter preferido que ficassem.

Tabela 3
Seleção de Líderes por Tipo de Regime

RAZÕES PARA MUDANÇA PARL. PRES. BUR.

Eleições regulares

162 66 22

das quais com limite de mandato

- 53 12
Eleições Fundadoras - - 17
TOTAL CAUSADO POR ELEIÇÕES 162 66 39

Remoções por partido

148 4 83

das quais em anos eleitorais

25
5

Mudanças de regime

14 24 32

das quais em anos eleitorais

6 8 5
Mortes 18 8 28
TOTAL POR OUTRAS RAZÕES 180 36 143
TOTAL GERAL 342 102 182
Número total de anos 1.186 420 1.785

Consideremos, em primeiro lugar, algumas informações básicas. Observamos um total de 892 eleições legislativas (870 anos nos quais uma eleição ocorreu e 11 anos com duas eleições): 318 em democracias parlamentaristas (incluindo as mistas); 108 em democracias presidencialistas; 375 em burocracias e 91 em autocracias,22 o que significa que, em média, uma legislatura foi eleita a cada 3,7 anos no parlamentarismo, 3,9 anos no presidencialismo e 4,8 anos em burocracias. Sob o presidencialismo ocorreram 86 eleições presidenciais (84 anos com uma eleição presidencial e duas na Argentina em 1973) ou uma a cada 4,9 anos. Em burocracias ocorreram 103 eleições presidenciais ou uma a cada 18 anos. Em autocracias elegeram-se 33 presidentes, um a cada 20 anos. Logo, os governantes são submetidos ao voto popular em média a cada 3,7 anos no parlamentarismo e a cada 4,9 anos no presidencialismo.

Mas a diferença entre presidencialismo e parlamentarismo é muito mais profunda. É necessário que estudemos estes dois sistemas separadamente.

Consideremos primeiramente o parlamentarismo. Como pode ser visto na Tabela 3, ocorreram 310 trocas pacíficas de primeiros-ministros, quer dizer, mudanças que se deveram à morte do governante ou à sua deposição forçada. Destas, 162 foram causadas por eleições e 148 por lutas intrapartidárias ou colapso da coalizão governante. Dessa forma, 48% das trocas de primeiros-ministros não se deveram à ocorrência de eleições: em quase metade dos casos de mudança de governo em regimes parlamentaristas não foram os eleitores que puniram o governante, mas sim os políticos. Pode-se sustentar, obviamente, que os líderes partidários antecipam o julgamento dos eleitores quando substituem o seu líder ou quando decidem abandonar a coalizão governamental. O que podemos dizer a este respeito é que se estas são as suas motivações, seus esforços são em vão: os primeiros-ministros que assumem o poder ao longo de uma legislatura têm menor probabilidade de serem reeleitos do que os que lideram seus partidos durante a eleição que os alça ao poder. A Tabela 4 mostra que enquanto apenas 30% dos primeiros sobrevivem a eleições subseqüentes à sua ascensão ao poder, 51% dos últimos continuam no poder após a ocorrência de eleições. Portanto, não é de todo óbvio que é a antecipação da reação dos eleitores que leva a estas mudanças. De qualquer forma, ao que tudo indica, o que denominamos "eleições" é o processo de seleção realizado por políticos sujeito à ratificação dos eleitores. "Eleger", então, não é o mesmo que "selecionar".

Tabela 4
Eleições no Parlamentarismo por Origem do Governante e Resultado

ORIGEM DO GOVERNANTE PM GANHOU PM PERDEU TOTAL
Assumiu durante mandato 24 (29,6%) 57 (70,4%) 81 (100%)
Eleições 94 (50,5%) 92 (49,5%) 186 (100%)
Desconhecida 20 13 33
Total 138 (46%) 162 (54%) 300 (100%)

Não consideramos que esta seja uma descoberta particularmente surpreendente: que os eleitores escolhem entre alternativas apresentadas por times de políticos que competem entre si é exatamente o que Schumpeter (1942) tinha em mente.

Ademais, uma vez designados por seus pares no partido, os primeiros-ministros submetem-se à ratificação dos eleitores: dos 148 primeiros-ministros que assumiram seus postos sem eleições, 82 submeteram-se ao veredicto popular no decorrer dos três anos após a formação do governo (os demais foram removidos sem que houvesse eleições, morreram, foram retirados pela força ou ainda estavam no poder em 1990). Na média, eles ficaram no poder 1,5 anos antes que se submetessem a eleições.23 Este dado, porém, torna-se ainda mais significativo se o olharmos de outro ângulo: existem períodos em regimes democráticos durante os quais os governantes não são aqueles a quem os eleitores escolheram. Mesmo que os eleitores tenham votado nos partidos destes indivíduos, eles provavelmente o fizeram sabendo quem era o líder do partido e, por decorrência, o eventual chefe de governo. Nesse sentido, eles votaram no partido com o fim de eleger um determinado chefe de governo e obtiveram como primeiro-ministro alguém em quem não tinham pretendido votar. Ademais, o primeiro-ministro escolhido pelo parlamento não precisa necessariamente pertencer ao mesmo partido do ministro deposto ou, a bem dizer, não precisa pertencer a partido algum. O exemplo mais extremado é o da Itália, onde, como observa Pasquino (1994, p. 25), "partidos governantes expropriaram a influência política dos eleitores ao fazer e desfazer, em todos os níveis, governos que mantinham pouca relação com os resultados eleitorais". O fato, então, é que em 17 % do tempo — um ano em cada seis — as democracias parlamentaristas são comandadas por governantes que não foram eleitos para chefiar os seus governos.

Analisemos agora o presidencialismo. Presidentes são eleitos (direta ou indiretamente) por eleitores e, a não ser por impeachment, não podem ser removidos pelos representantes legislativos. De fato, como mostra a Tabela 3, de um total de 70 trocas pacíficas de presidentes, todas, com exceção de quatro, foram ocasionadas por eleições.24 É claro que em sistemas presidencialistas os candidatos às eleições são também, com freqüência, escolhidos por seus pares políticos. Mas pelo menos quase nunca os chefes de governo são outros que não aqueles escolhidos pelos eleitores.

No entanto, o conceito de "eleger" é também problemático no presidencialismo. Se as 86 eleições que observamos levaram à saída de 66 presidentes, 53 foram forçadas pela existência de limites constitucionais ao número de mandatos presidenciais, ou seja, os eleitores não poderiam ter reeleito o presidente em exercício mesmo que o quisessem.

Simon Bolivar uma vez observou que "nós elegemos monarcas a quem chamamos presidentes". E foi este medo de que presidentes se transformassem em monarcas que justificou a imposição de limites constitucionais ao número de mandatos presidenciais. Tal preocupação parece proceder, já que aparentemente o presidencialismo confere vantagens excessivas aos governantes: dentre 22 presidentes que não se encontravam constitucionalmente limitados em sua capacidade de reeleição, 14 não foram reeleitos, e destes apenas 6 podem ser contados como casos de verdadeiras derrotas eleitorais: na República Dominicana em 1978, quando Joaquim Balanger perdeu para Antonio Gusmán Fernández; na Nicarágua em 1990, quando Daniel Ortega Saavedra perdeu para Violeta Chamorro; nos Estados Unidos em 1977, quando Gerald Ford perdeu para Jimmy Carter, e em 1981, quando Carter perdeu para Ronald Reagan; nas Filipinas em 1953, quando Elpidio Quirino perdeu para Ramon Magsaysay, assim como em 1961, quando Carlos Gracia perdeu para Diosdado Macapagal. Em todos os outros casos o governante, por razões diversas, não concorreu. Estes casos incluem, por exemplo, Lyndon Johnson em 1969 nos Estados Unidos; Salvador Jorge Blanco na República Dominicana em 1986; Nereu Ramos no Brasil em 1956, e Hector Campora na Argentina em 1973. Portanto, ocorreram 14 eleições nas quais os presidentes em exercício se lançaram à reeleição; dado que venceram em 8 e perderam em 6, suas chances de vitória eram de 1,3 para 1, o que contrasta com chances de 0,66 para 1 dos primeiros-ministros.

Assim, mesmo que a existência de limites constitucionais ao número de mandatos executivos seja justificada, e que a sua inclusão nas constituições indique um consentimento putativo por parte dos eleitores, o fato é que na maioria dos regimes democráticos presidencialistas os eleitores não podem reeleger os seus governantes, queiram ou não queiram. Como mostra a Tabela 5, este foi o caso em 64 das 86 eleições presidenciais que observamos.

Tabela 5
Limites de Mandato em Eleições Presidenciais

Número total de eleições 86
Eleições que ocasionaram a mudança de governante 66

Devido a limites de mandato

53
Outras razões 13
Governante concorreu e perdeu 6
Governante não concorreu 7
Eleições que não ocasionaram a mudança de governante ou mudança por outras razões 20
Governante foi reeleito 8

Mudança não relacionada com eleições

12
Governante com mandato limitado 11
Governante com mandato não limitado 1
Governantes que podiam ser reeleitos nas eleições correntes (13 + 8 + 1) 22

Mas não em eleições futuras

12
Governantes que não podiam ser reeleitos (53 + 11) 64
Governantes que, por uma razão ou outra, não podiam ser reeleitos (12 + 64) 76
Governantes que poderiam ser sempre reeleitos 10

Em suma, se nos regimes parlamentaristas em cerca de um sexto do tempo o chefe do governo não é alguém que tenha sido eleito como tal, no presidencialismo em três quartos do tempo o chefe do governo é alguém que os eleitores não podem reeleger, mesmo que eles o queiram. Se esta é a razão para que observemos tão pouca responsabilidade política nas democracias, não sabemos. Mas é certo que o elo entre democracia e eleições é menos do que definicional.

Eleições e responsabilidade

Como nosso objetivo era comparar regimes com diferentes regras institucionais (incluindo, a bem da verdade, alguns sem nenhuma regra), consideramos a possibilidade de que os chefes de governo mudassem em anos não eleitorais, o que descobrimos ser o caso mesmo em democracias. Mas responsabilidade política supostamente opera por meio de eleições, e nossos resultados negativos podem se dever ao fato de não termos distinguido em nossa análise original entre anos eleitorais e não eleitorais. Precisamos, portanto, examinar diretamente a conexão específica entre eleições e responsabilidade.

Nas democracias presidencialistas, como vimos, mudanças de presidente ocorrem quase que exclusivamente em anos eleitorais. No entanto, na maior parte dos casos, estas mudanças ocorrem não porque os eleitores avaliam o desempenho do governo negativamente, mas porque eles não têm oportunidade de premiar o governante por seu desempenho. Logo, não é de surpreender que o desempenho econômico não tenha nenhum impacto sobre a probabilidade de o governante sobreviver em seu posto. Uma vez que distinguimos ("censuramos", no sentido explicado acima) os mandatos nos quais os presidentes não podem se reeleger, a sobrevivência dos presidentes em seus postos torna-se algo sensível ao crescimento da força de trabalho, de maneira similar ao que se observa com os primeiros-ministros (ver o painel inferior da Tabela 2). No entanto, os presidentes que podem ser reeleitos são poucos.

Em democracias parlamentaristas podemos distinguir os riscos advindos especificamente de eleições dos riscos aos quais os primeiros-ministros estão expostos durante os anos não eleitorais, seja o de ser substituído pacificamente ou o de ser violentamente removido do cargo. Esta distinção, no entanto, não altera os resultados originais: um modelo (exponencial) de risco múltiplo, no qual estes riscos são tratados separadamente, demonstra mais uma vez que apenas o crescimento da força de trabalho afeta de alguma forma a sobrevivência dos primeiros-ministros em seus postos, tanto nos anos eleitorais quanto nos anos não eleitorais. Assim, tudo o que podemos concluir é que as democracias parlamentaristas geram responsabilidade política no máximo com relação ao crescimento do emprego (o que provavelmente significa redução do desemprego); mas apenas em relação ao emprego.

Uma vez que, com exceção de emprego para primeiros-ministros e poucos presidentes que podem ser reeleitos, o desempenho econômico não afeta a sobrevivência de governantes mesmo nos anos eleitorais, concluímos que eleições não geram responsabilidade por resultados econômicos nos regimes democráticos.

Conclusão

Ou bem os nossos procedimentos estatísticos são falhos, ou bem os governantes não são responsáveis politicamente perante o eleitorado. Tudo o que podemos fazer neste ponto é especular.

(1) É possível que os eleitores se preocupem com outras coisas que não o seu bem-estar material. Dado que eles só possuem um instrumento — o voto — com o qual punir os governantes por decisões tomadas em diversas áreas, os eleitores podem decidir responsabilizar o governo por decisões em áreas que não a econômica.

(2) É possível que os eleitores estejam usando os seus votos no sentido de induzir os governantes a agir de uma maneira representativa, mas que estejam ao mesmo tempo estipulando uma pauta de incentivos inadequada ao não dar chances suficientes para que os governantes se reelejam quando apresentam um bom desempenho. Mesmo que os eleitores sejam mais passíveis de votar a favor dos governantes que melhorem a sua situação, é possível que não o façam suficientemente para induzi-los a buscar a reeleição e não a extração de rendas monopólicas.IIIPara que a responsabilidade política seja imposta, faz-se necessário não apenas que a probabilidade de voto a favor do mandatário aumente à medida que o desempenho econômico melhore, mas também que os governantes que apresentem um bom desempenho tenham uma boa chance de se reeleger. E existe evidência no sentido de que os eleitores tendem a votar contra os governantes mesmo que estes apresentem um bom desempenho. Remmer (1993) mostrou que em 21 pares de eleições ocorridas entre 1982 e 1990 na América Latina a proporção de voto no governo caiu. A queda média foi de -13,1% e a constante na regressão da proporção de voto no partido governante contra o desempenho econômico foi de cerca de -21%. Paldam (1991, p. 24), por sua vez, mostrou que em 190 pares de eleições nos países da OCDE a média da mudança da proporção de voto no governo foi menor, mas mesmo assim negativa: -1,6%. Ele concluiu que "nós temos que aceitar que as pessoas simplesmente não gostam de ser governadas, ou pelo menos, que elas gostam de mudanças". Se as pessoas votam contra os governantes a despeito do que estes fazem, os governantes não têm incentivos para fazer nada por elas. Logo, se a probabilidade de reeleição é baixa mesmo quando o desempenho econômico é bom, a conclusão, baseada em pesquisas de opinião, de que os eleitores são mais propensos a votar nos governantes quando as condições econômicas são melhores não é inconsistente com os achados, baseados em dados agregados, segundo os quais o desempenho econômico não afeta a sobrevivência dos governantes.

(3) É possível que os eleitores não tenham as informações necessárias para avaliar o desempenho do governo. Especificamente, se eles não observam algumas condições que os governantes observam, ou se eles não conhecem a relação entre políticas e resultados, os eleitores não podem estar certos de quanto eles podem esperar em termos de desempenho. Nestes casos, os eleitores votarão contra governos com mal desempenho e a favor de governos com bom desempenho quando as condições objetivas forem de fato ruins, mas eles vão indiscriminadamente reeleger os governantes quando as condições forem boas. Tentamos controlar o efeito destas condições distinguindo os períodos pós-1975 e pós-1982, assim como os períodos durante os quais os países mantiveram acordo com o Fundo Monetário Internacional, mas estes esforços foram em vão.

(4) Tomar as chances de sobrevivência no poder como condicionadas ao desempenho passado supõe que os eleitores são míopes, no sentido de que, ao fim do mandato, eles não consideram o valor presente do futuro que o governante está deixando como seu legado. Se os eleitores são totalmente racionais, a sua avaliação do futuro entra na avaliação que fazem do desempenho passado do governante. Tudo o que pudemos fazer para testar esta hipótese foi examinar se a direção das mudanças na economia (a diferença de primeira ordem nas variáveis de desempenho econômico) afeta a sobrevivência dos chefes de governo. Os resultados demonstram que esta mudança não tem nenhum efeito sobre a sobrevivência de governantes, mas é possível que uma melhor medida de avaliação do futuro pelos eleitores tenha. No entanto, é sugestivo que o nível de investimento (público e privado) no Produto Nacional Bruto afete negativamente as chances de sobrevivência dos primeiros-ministros:25 de acordo com este teste os eleitores são, de fato, míopes.

(5) Finalmente, se os eleitores usam o voto com um sentido prospectivo, para escolher governos melhores, é possível que estes sejam representativos simplesmente porque boas políticas ou políticos tenham sido escolhidos, mas não porque a representação tenha sido induzida pelo medo da sanção eleitoral. Note, porém, que deveríamos ter observado uma relação entre desempenho e sobrevivência mesmo que os eleitores estejam usando seus votos prospectivamente. Ainda que o uso prospectivo do voto reduza o poder de incentivos sobre os governantes, o desempenho passado do governante é ainda relevante para informar os eleitores sobre a probabilidade de que o opositor terá um desempenho melhor. Logo, as informações sobre o desempenho passado do governante deveriam afetar as suas chances de reeleição.

Assim, existem boas razões para se esperar que, se os governos são representativos — quer porque temam sanções eleitorais retrospectivas, quer porque bons políticos sejam selecionados com base em considerações prospectivas —, deveríamos observar que os governantes com mau desempenho possuem chances maiores de serem removidos de seus postos. Isto não foi observado e, a não ser que os nossos métodos estatísticos sejam falhos, a implicação deste fato é que eleições não são um instrumento efetivo para induzir a representação.

NOTAS

1 Para a justificativa conceitual e detalhes históricos ver Alvarez, Cheibub, Limongi e Przeworski (1996).

2 Entendemos por "partido" uma lista de candidatos apresentada aos eleitores. Diversos tipos de "frentes", que formalmente agrupam vários partidos mas que se apresentam aos eleitores como uma única lista, são considerados um único partido em nossa definição.

3 Este último critério pode parecer estranho, e na verdade o é. O problema ao se classificar regimes políticos é que existem alguns casos (na verdade, 8,3% da amostra) nos quais todos os três critérios prévios são satisfeitos mas é sempre o mesmo partido que ganha as eleições, quase sempre por uma ampla margem de votos. O caso paradigmático é Botswana. A questão, nestes casos, é se o partido no poder teria realizado eleições se não estivesse seguro de vencê-las, e se teria saído do governo se as tivesse perdido. Já que a história não produziu ainda nenhuma informação que permita responder a estas questões, a opção metodológica é errar, seja classificando estes regimes como democráticos quando na verdade eles não o são (erro do tipo I), seja os classificando como não democráticos mesmo que eles o sejam (erro do tipo II). Decidimos ser prudentes e classificar estes casos como ditaduras.

4 Existem inúmeros critérios que distinguem estes dois sistemas, mas eles coincidem quase que perfeitamente com os que utilizamos. Ver Lijphart (1992).

5 Shuggart e Carey (1992) introduzem várias outras distinções entre estes sistemas.

6 Alguns países que não tinham legislativo em um ano específico estavam obviamente experimentando transições de regime. Estes casos foram reclassificados de forma apropriada.

7 Existem dados econômicos comparáveis para 141 países desde 1950, mas destes excluímos seis produtores de petróleo. Dentre os países com população maior que um milhão de habitantes nos anos 80 excluímos, por falta de dados econômicos, a Albânia, o Butão, Cuba, Coréia do Norte, Líbano, Namíbia e Vietnã, todos ditaduras.

8 Além dos Estados Unidos e da América Latina, onde todas as democracias são presidencialistas, sistemas presidenciais também existiram no Congo (1960-62), Gana (1979-80), Nigéria (1979-82), Uganda (1980-84), Bangladesh (desde 1986), Coréia do Sul (desde 1988) e Filipinas (1950-64 e desde 1986). Portugal entre 1976 e 1981 também foi classificado como democracia presidencialista.

9 Três a mais do que o número de democracias mencionado acima, já que em três casos houve uma mudança do sistema institucional sem que houvesse quebra da democracia: França em 1958 e Brasil em 1961 e 1963.

10 Transições entre burocracias e autocracias são comuns, o que explica o maior número de regimes ditatoriais quando distinguimos os tipos de ditaduras.

11 Codificamos o número de trocas de governante durante cada ano usando como fontes Graça (1985), Bienen e Van de Walle (1991) e Banks (1993). Contrariamente a Bienen e Van de Walle, não fizemos nenhum esforço para excluir governos provisórios, partindo do princípio de que não conseguiríamos distinguir os casos de governantes que tentaram consolidar o seu poder e falharam dos casos em que eles não tentaram fazê-lo.

12 Quando codificamos os períodos, perdemos a informação sobre os governos que duraram menos de um ano (isto é, aqueles para os quais o número de governantes em um único ano é maior do que 1). Isto nos deixou com 674 períodos, aos quais devemos somar outros 118 que já haviam começado quando iniciamos nossa observação.

13 Não distinguimos entre mortes naturais (como nos casos de Josef Broz Tito na Iugoslávia, Juan Domingo Peron na Argentina e Bjarni Benediktsoon na Islândia), assassinato (Anuar el-Sadat no Egito, John F. Kennedy nos Estados Unidos e Olof Palme na Suécia), suicídio (Getúlio Vargas no Brasil e Antônio Guzmán Fernández na República Dominicana) ou supostos acidentes (Samora Machel em Moçambique, René Barrientos na Bolívia, Mohammad Zia ul-Haq no Paquistão e Ramon Magsaysay nas Filipinas).

14 O caso mais extremo é o da Jordânia, onde o legislativo foi fechado em 1966, em 1974 (até 1984) e em 1985 (até 1989). Outros casos de mudança freqüente de regime político sem troca do chefe do executivo incluem o Marrocos, onde o legislativo foi fechado em 1963 (até 1965), 1970 (até 1972) e 1978, e Burkina Faso, onde Sangoulé Lamizana permitiu a convocação de um legislativo eleito em 1970 para fechá-lo em 1974 e reabri-lo em 1978.

15 Os dados referentes ao crescimento da renda, consumo e força de trabalho, assim como os referentes ao nível do gasto público, baseiam-se nas "Penn world tables", versão 5.6 (PWT5.6). Ver Summers e Heston (1988 e 1991) para uma descrição das informações. Os dados sobre inflação são do Fundo Monetário Internacional (1995). Uma vez que só obtivemos informação sobre inflação para 3.426 casos, o tamanho da amostra não é o mesmo em todas as análises.

16 Além destes resultados, consideramos ainda o impacto das mudanças nas taxas de inflação sobre a sobrevivência dos governantes e descobrimos que elas não têm nenhum efeito importante. Experimentamos também com defasagens de primeira e segunda ordens nos indicadores econômicos, assim como com várias combinações entre as variáveis econômicas e controles por regiões (países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, OCDE) e períodos. Os resultados permaneceram qualitativamente os mesmos, com os coeficientes de crescimento da força de trabalho no parlamentarismo oscilando em torno do nível de confiança de 10%.

17 Exceções existem e tendem a ocorrer quando a política econômica é explicitamente formulada de forma a envolver mudanças intertemporais. Ver Stokes (1996a) para uma discussão geral, Przeworski (1996) para o caso da Polônia e Stokes (1996b) sobre o Peru. Note-se, no entanto, que Paldam (1991) também observou sinais para as taxas de inflação cuja direção era inesperada.

18 Estas variáveis foram extraídas e adaptadas de Banks (1993).

19 Para as diferentes visões sobre o papel das eleições ver Manin, Przeworski e Stokes (no prelo).

20 Esta tabela e todos os dados que apresentamos foram corrigidos para os casos nos quais as eleições ocorreram em um ano e a troca do governo ocorreu no ano seguinte. Nestes casos consideramos o ano da troca do governo como o ano da eleição.

21 Já que nosso foco são as democracias, não nos deteremos sobre os resultados referentes às ditaduras. Mas como pode parecer estranho que em ditaduras governantes deixem o governo por eleições, eis a explicação. Dentre as 39 trocas de governante em burocracias que ocorreram em anos eleitorais, 12 deveram-se a limites quanto ao número de mandatos presidenciais: El Salvador (1956, 1967, 1972 e 1977), Honduras (1954) e México (1952, 1958, 1964, 1970, 1976, 1982 e 1988). Dezessete destas 39 trocas foram eleições fundadoras, isto é, eleições que levaram ao estabelecimento de uma democracia parlamentarista ou presidencialista. Os dez casos restantes consistem de regimes de partido único ou casos que chamamos de ditaduras "Tipo II", conforme explicado na nota 3.

22 O fato de que tenham ocorrido eleições legislativas em autocracias não é incompatível com nossa definição deste regime: nestes casos, não se permitiu que as legislaturas eleitas se reunissem ou elas foram rapidamente dissolvidas. No caso da República Dominicana em 1961, ocorreram eleições sob democracia, mas o congresso foi fechado seguindo um golpe de Estado.

23 Já que nossos dados são anuais, atribuímos seis meses a cada um dos 18 primeiros-ministros que enfrentaram eleições no ano no qual formaram o governo, um ano a cada um dos 29 que enfrentaram eleições no ano seguinte, dois anos a cada um dos 22 que esperaram dois anos antes de enfrentar eleições e três anos a cada um dos 13 que esperaram três anos.

24 As quatro foram a renúncia de Richard Nixon em 1974, as mudanças de João Café Filho para Carlos Luz e para Nereu Ramos no Brasil em 1955, após o suicídio de Getúlio Vargas em 1954, e a transferência de poder de Velasco Ibarra para Carlos Arosemena Monroy no Equador em 1961.

25 O coeficiente da proporção de investimento no PNB é -0.0195 (t=2.888).


Palavras-chave: Democracia; Eleições; Responsabilidade política; Parlamentarismo; Presidencialismo
O objetivo do artigo é examinar a validade empírica de duas proposições, que se relacionam em virtude da definição da democracia como regimes nos quais os governantes são selecionados por meio de eleições regulares e competitivas: primeiro, que os regimes democráticos se caracterizam pela responsabilidade dos governantes perante os governados e, segundo, que as eleições funcionam como o mecanismo que produz esta responsabilidade. Para efeitos da análise, os autores consideram que os governantes são politicamente responsáveis quando sua sobrevivência no poder depende do desempenho econômico. Utilizando dados para 135 países observados, com algumas exceções, entre 1950 e 1990, estimam, então, a probabilidade de sobrevivência no poder de líderes democráticos e autoritários dada a duração de seus governos e os resultados econômicos produzidos. Com base nesta análise os autores concluem que a afirmação de que a democracia induz à responsabilidade política é, no mínimo, ampla demais; que as eleições não geram resultados econômicos nos regimes democráticos; e que a relação entre democracia e eleições é menos do que definicional. Concluímos o artigo com considerações mais gerais que sugerem explicações plausíveis para os resultados encontrados e suas implicações para a teoria democrática.


* Tradução de Eduardo Cesar Marques.

I N. do T. — No original, "accountability of rulers to the ruled". Neste artigo accountability foi traduzido como responsabilidade política e accountable como politicamente responsável.

II N. do T. — A palavra inglesa "incumbent", que designa a pessoa ou organização que ocupa posição ou cargo, não tem tradução direta na língua portuguesa. A palavra, utilizada inúmeras vezes no original, foi traduzida como "partidos no poder" (incumbent parties) e "governantes" (incumbents).

III N. do T. "Rents" no original.